O Laboratório Químico e as invasões francesas




As invasões francesas foram um factor de grande instabilidade no funcionamento da instituição universitária. Alguns professores da Faculdade de Filosofia prestaram relevantes serviços para a defesa contra os franceses. Em 1808 vários estudantes da Academia de Coimbra alistaram‑se num batalhão que, sob o comando de Tristão Álvares da Costa, major de engenharia e lente de Cálculo, combateu os franceses. Por sua vez, os lentes formaram outra secção, capitaneada por Fernando Fragoso de Vasconcellos, primeiro lente da Faculdade de Cânones. O próprio Vice‑Reitor, Manuel de Aragão Trigoso, tinha sido chamado para ocupar o cargo de Governador-Geral da cidade. No ano lectivo de 1810/1811 a Universidade permaneceu encerrada. Neste período o Laboratório Químico desempenhou um papel fundamental na resistência contra a ocupação francesa. Foi transformado numa verdadeira fábrica de munições de guerra. O seu director, o químico Thomé Rodrigues Sobral, teve um desempenho notável na luta contra os invasores. Sob a sua orientação fabricou‑se uma grande quantidade de pólvora. Ainda hoje existe na Universidade de Coimbra o grande almofariz em pedra utilizado nesta tarefa. Este professor não só dirigia e organizava todo o grupo de trabalho no Laboratório Químico, como preparava com as suas próprias mãos as munições de guerra. Foi neste período que todo o arsenal armazenado no edifício do Laboratório Químico esteve na eminência de explodir. Ao deflagrar um incêndio, com o edifício repleto de barris de pólvora, valeu a serenidade de Rodrigues Sobral, que conseguiu evitar a catástrofe utilizando água de uma cisterna próxima. Em consequência do seu empenhamento na resistência, Sobral viu a sua casa destruída por um incêndio ateado pelos franceses. Neste incêndio ficaram irremediavelmente perdidos os seus preciosos manuscritos, bem como a excelente biblioteca que possuía, reunida ao longo de trinta anos. Entre os manuscritos destruídos perdeu‑se o Compêndio de Química que se preparava para publicar. Quando o exército francês chegou a Coimbra, uma das primeiras preocupações dos comandos militares foi o de saberem onde ficava a casa do mestre da pólvora, nome dado ao professor de Química pelos invasores. O resultado foi o bárbaro incêndio da sua casa na Quinta da Cheira. Mais tarde, reconhecendo o seu elevado empenho na defesa nacional, o governo português, por aviso régio de 1816, mandou reedificar as suas casas.

No Laboratório Químico também foram desenvolvidas acções muito úteis no domínio da saúde pública. Em Agosto de 1809 verificou-se aí intensa actividade para que fosse debelado o surto de peste que então ocorreu. Para o efeito assumiu particular importância a acção de Rodrigues Sobral. Com o objectivo de purificar a atmosfera, erradicando a epidemia, foram fabricados no Laboratório desinfectadores de cloro e ácido muriático oxigenado, que eram distribuídos gratuitamente por casas particulares, hospitais, cadeias e até pelas ruas. Em Outubro de 1813 foi publicado no Jornal de Coimbra um relatório pormenorizado de toda esta actividade.

Outro professor de Química que se distinguiu pelos seus estudos da composição da água foi Manoel José Barjona, na época em que também os britânicos James Watt e Henry Cavendish realizavam as suas primeiras experiências neste domínio. Foi durante as experiências de síntese da água, realizadas no Laboratório Químico, juntamente com Rodrigues Sobral, que Barjona foi vítima de uma violenta explosão do gasómetro, tendo ficado cego de um olho. Contribuindo para desenvolver o ensino das ciências, Barjona foi sempre um activo membro das Congregações da Faculdade. Em 1823 submeteu à aprovação do Conselho da Faculdade as suas Tábuas Mineralógicas, que viria a ter uma segunda edição em 1835. Já havia publicado em 1798 um compêndio intitulado Metallurgica Elementa(Elementos de Metalurgia).

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