Os Guardiões da Joanina
A Biblioteca Joanina, exemplo de uma perfeita harmonia entre a arte e a cultura. No seu interior, revestido de belas estantes e varandas, cobertas de ricas talhas e pinturas a ouro, sobre fundos azuis e vermelhos, ornamentados com motivos orientais (Chinoiserie), podemos encontrar valiosíssimas coleções de obras publicadas por toda a Europa, até ao ano de 1800, com especial incidência nas áreas que serviram de base à constituição da própria Universidade: Direito (Civil e Canónico), Medicina e Teologia.
Todo o edifício foi idealizado com vista à preservação natural dos seus livros, através da concretização de uma climatização natural, proporcionada quer pela própria orientação da Biblioteca, bem como da espessura das suas paredes (211 cm), as quais proporcionam as conduções necessárias à conservação natural dos livros.
Contudo, o mais extraordinário facto ambiental da Biblioteca Joanina, e aquele que junto do grande público suscita grande admiração é a permanência, no seu interior de alguns dos seus principais guardiões: os morcegos da Joanina.
Tornados famosos pelo próprio escritor italiano Umberto Eco, a propósito de uma visita à Biblioteca Joanina em 1966, estes pequenos mamíferos vivem numa pequena colónia, no interior da própria Biblioteca, na qual encontram abrigo no cimo das altas estantes. Aqueles que hoje habitam a Biblioteca ainda são os descendentes daqueles há quase trezentos anos ali se introduziram, quando o edifício foi guarnecido de livros pela primeira vez.
Em troco do abrigo proporcionado pela Biblioteca, estes animais da noite retribuem através da proteção dada aos livros nela contidos, através da caça de insetos bibliófagos, a presença dos quais poderia danificar os livros, quer o papel das suas páginas, que as próprias capas de couro.
Devido à sua capacidade de fácil deteção de insetos, voadores e/ou rastejantes, os morcegos facilmente os alcançam, alimentando-se deles, numa perfeita relação simbiótica: a Biblioteca oferece o abrigo e, em troca, o morcego protege os livros. O único efeito secundário perigoso desta relação é o excremento do morcego que, tendo propriedades ácidas, poderia danificar as mesas da Bibliotecas, também elas parte do seu valiosíssimo espólio. Por essa mesma razão, ao fim do dia, tais mesas são cobertas, para sua proteção.
Para dissabor daqueles que visitam a Biblioteca Joanina, os morcegos raramente aparecem durante o dia. No entanto, aquando da realização de espetáculos no Piso Nobre, estes guardiões da noite têm sido vistos, como que atraídos pelos sons do piano, a sobrevoar os seus ouvintes, proporcionando, assim, um espetáculo adicional e único para todos os presentes.
Ao fim do dia, é comum poder-se observar o seu voo em torno da Torre da Universidade, num claro sinal de que a sua vigília se iniciou.
Gustavo Gonçalves
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